quarta-feira, 21 de julho de 2010

CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA PSICANÁLISE

1 - O INCONSCIENTE

Freud, (1924 [1923]) coloca que a psicanálise cresceu em meio ao interesse em se saber mais sobre as doenças nervosas, colocando fim a impotência dos médicos no tratamento destas enfermidades. Inicialmente a investigação se concentrava no fisiológico, onde o esforço era para localizar nas regiões do cérebro a causa dessas doenças, não havendo nenhuma compreensão do fator psíquico. Reconhecia-se a existência do sofrimento que era de uma outra ordem ainda desconhecida, porém procurava-se a solução para esse sofrimento no corpo, no anatômico.

É nesse cenário constituído de certa curiosidade, que em 1880 começa-se a praticar a hipnose, sendo reconhecido que mudanças somáticas aconteciam como conseqüência de influencias mentais, podendo-se então notar a existência de processos mentais inconscientes.

Através da fala do paciente o médico tinha acesso a esses processos mentais, o que possibilitou a descoberta de que eventos passados tinham poder de sobredeterminaçao sobre a vida desses pacientes. O inconsciente propriamente dito consiste de processos reprimidos, que exercem pressão no consciente da mente do sujeito modelando a sua vida cotidiana.

Em sua primeira tópica sobre o aparelho psíquico Freud (1900) o divide em Consciente, Pré-consciente e Inconsciente. A consciência, segundo ele, é breve e passageira e se destina a recepcionar as percepções que são de antemão conscientes. Tanto as que provêm de fora (percepções sensoriais), como as que provêm de dentro e que chamamos de sensações e sentimentos. No Pré-consciente estão as memórias que se encontra em estado latente, ou seja, podem se tornar conscientes. O Recalque é o estado em que as idéias estão antes de se tornarem conscientes e é ele que nos fornece o modelo para a compreensão do inconsciente. A censura nesse caso é uma barreira criada pelo Eu para impedir que aquilo que foi recalcado se torne consciente.

Na segunda tópica do aparelho psíquico Freud (1923) o divide em Id, Ego, e Superego, introduzindo uma mudança no sentido de pensar o aspecto tópico (lugares psíquicos) da psicanálise. Ele traz essa nova tópica simultaneamente a uma nova teoria pulsional (pulsão de vida x pulsão de morte), isto porque a idéia de inconsciente está se ampliando. A noção de que havia um lugar para o inconsciente é substituído pelo entendimento de que os processos inconscientes atravessam o Id, o Ego e o Superego. Um exemplo disso é a culpa inconsciente presente no Superego. A noção de inconsciente, então, passa a ser onipresente. Freud (1923) assinala que o inconsciente não se confunde com o recalcado. O inconsciente está, além disso, sendo o recalcado um exemplo de material inconsciente, ou de processo psíquico inconsciente.

Em seu artigo O Eu e o Id, Freud (1923) coloca que “ocorre que através da técnica psicanalítica, é possível sim, suspender a ação das forças opositoras e trazer a tona essas idéias, torná-las conscientes”. Afirma assim que existem formas de trazer à tona os conteúdos inconscientes.

O Inconsciente, segundo os escritos freudianos se expressa por meio das seguintes formas:

 Chistes - jogos de palavras aparentemente sem sentido, mas que ultrapassa o seu próprio conteúdo ao utilizar-se do cômico.

 Através dos atos falhos que são manifestações de desejos inconscientes por meio de lapsos durante a fala onde palavras são substituídas por outras que aparentemente não faz sentido, mas na realidade expressam o que está reprimido.

 Sonhos – forma disfarçada de realização de desejos. Sobre ele incide uma censura cujo efeito e a deformação onírica, cujo objetivo é proteger o sujeito do caráter ameaçador dos seus desejos.

 Associação livre – livre associação de palavras, sem pressionar a busca por uma lembrança específica. É o método terapêutico por excelência da psicanálise.


2-PULSÃO (TRIEB)

A idéia de pulsão é apresentada por Freud (1915) como um “conceito de fronteira”, algo que está no limite entre o somático e o orgânico, sendo equiparada a uma tensão que tem como alvo a descarga.

...um conceito-limite entre o psíquico e o somático, como o representante psíquico dos estímulos que provêm do interior do corpo e alcançam a psique, como uma medida da exigência de trabalho imposta ao psíquico em conseqüência de sua relação com o corpo. (Freud, 1915 p.148).

Essa referência exige que esclareçamos que não se trata somente de algo orgânico ou somente psíquico, mas de uma interligação da psique ao corpo que leva a um trabalho de busca de objetos. Essa energia que manifesta no âmbito psíquico é marcada por afetos, imagens e, sobretudo pela linguagem.

A pulsão segundo Freud (1915), é composta pelos seguintes elementos:

• Pressão – um impulso em direção ao alvo (objeto).

• Meta – é sempre a busca por satisfação.

• Objeto – elemento variável e incontingente, por meio de que a pulsão pode alcançar sua meta.

• Fonte – é orgânica, isto é, provêm sempre do corpo.

Há o pressuposto de que existe uma pressão constante que leva o organismo vivo a buscar o prazer e repelir o desprazer, sendo este o princípio que rege a definição de Pulsão Sexual, ou seja, o Princípio do Prazer. A pulsão busca o prazer e quem oferece essa possibilidade de satisfação é o outro enquanto objeto e esse outro é limitado, nunca vai dar conta de proporcionar uma satisfação total. Podemos então afirmar que a satisfação é sempre parcial, que ela perdura por um tempo e depois há um retorno da pressão.

Vamos encontrar na obra freudiana duas teorias sobre as pulsões, sendo que cada uma dessas teorias utiliza um conceito de pulsão. É preciso salientar que a segunda teoria não substitui a primeira, mas a engloba, com algumas alterações.



A primeira teoria pulsional: Pulsão Sexual x Pulsão de autoconservação

Freud (1920) afirma que os processos psíquicos são regulados de forma automática pelo princípio do prazer, sendo que a noção de prazer e desprazer é relacionada com a quantidade de excitação presente na vida psíquica, de forma que o desprazer está relacionado ao aumento e prazer a diminuição dessa quantidade. Retoma-se a suposição de que o aparelho psíquico trabalhe para manter esse nível de excitação em quantidade baixa, ou pelo menos constante, existindo outras forças que se opõem a essa tendência ao prazer.

Ao princípio do prazer está relacionado modo primário de funcionamento psíquico, sendo que na medida em que ocorre o desenvolvimento as pulsões de autoconservação do Eu acabam por conseguir que o principio do prazer seja substituído pelo princípio da realidade (pulsão de autoconservação).

A primeira teoria pulsional compreende então uma pulsão sexual e outra que Freud considera dessexualizada, que é a pulsão de autoconservação, uma tendência do sujeito em tentar sobreviver ligado ao Princípio da Realidade, que entra em choque com a busca do prazer. A pulsão sexual nos remete a possibilidade de representação que o sujeito faz da realidade.



A Segunda Teoria Pulsional: Pulsão de Vida x Pulsão de Morte

Para Freud (1920) a pulsão sexual passa a ter a conotação de Pulsão de Vida a partir da concepção de que esta é tudo que unifica que possibilita prazer, é todo movimento que o sujeito faz na direção da obtenção de um prazer, mesmo parcial. Aquilo que sofre recalque, que está ligado à pulsão de vida, retorna de uma forma repetitiva. A repetição nos diz que aquilo que foi recalcado insiste em voltar à consciência e isso é o sintoma, desejo inconsciente insiste na busca de satisfação. Essa tendência Freud vai chamar de Compulsão á Repetição. O sintoma tem essa característica de uma repetição, de uma compulsão á repetição.

O que de fato nos surpreende são os casos em que a pessoa parece vivenciar passivamente uma experiência sobre a qual não tem nenhuma influencia, só lhe restando experimentar a repetição da fatalidade. (Freud, 1920, p.147).

A compulsão à repetição é inscrita pela falta de sentido, ou seja, pelo traumático. Isso nos remete á concepção de trauma como aquilo que foi vivido e que não tem sentido, não foi possível significar. Esse traumático está inscrito no início da vida, pois nesse início a criança não tem acesso á linguagem, sendo assim, não é ela quem dá sentido ás coisas. A Pulsão de Morte é introduzida nesse momento com a idéia de que existe algo na vida humana que é sem sentido, que não é explicável, é enigmático, não representável e que isso faz parte da existência humana. O não representável não se pode recalcar, pois não tem uma idéia que o represente, logo o que é da ordem do recalque é a pulsão de vida. O que impulsiona a existência humana é a pulsão de morte, pois ela é primária, está inscrita no início da vida humana e Freud (1920) vai se utilizar do mito biológico de que o fim da vida é a morte afirmando que desde que o sujeito nasce ele está caminhando para esse não sentido, para o não representável. Ele afirma que essa é a força mais poderosa. Por outro lado ele afirma que a Pulsão de Vida que é sexual, barra a Pulsão de Morte, ao dar sentido ás coisas.

Ao analisar os sonhos dos neuróticos de guerra Freud (1920) percebe que eles apontam para uma compulsão à repetição numa tentativa de estabelecer um limite, um controle, para aquilo que não teve sentido, para aquilo que fugiu do controle do sujeito. As situações traumáticas estão acima do psiquismo do sujeito, onde a morte está presente o tempo todo muito próximo do sujeito. Ele percebe então, que esses sonhos eram o retorno do não sentido e que os sonhos eram uma tentativa do sujeito dar conta dessa intensidade pulsional vivida que não foi possível simbolizar. Se o sujeito não consegue dar sentido, não tem como esquecer. Do ponto de vista da existência humana a falta de sentido é a morte.

Concluindo, Freud nos leva à compreensão de que o principio do prazer é quem rege a Pulsão de Vida. O sonho seria uma realização do desejo, daquilo que sofreu recalque que tem um caráter sexual, porém ao analisar os sonhos dos neuróticos de guerra conclui que existe algo que está além do princípio do prazer, que está a serviço da morte, uma Pulsão de Morte.